quinta-feira, novembro 09, 2006

Eu quero é ser o Bata Azul num Centro de Inspecção Automóvel

Se houvesse a possibilidade de fazer recuar o tempo até àquele momento em que somos obrigados de tomar a “tal decisão” em relação ao que queremos para o nosso futuro, sem dúvida que teria enveredado por uma profissão muito mais aliciante do que tenho actualmente.

Se Deus tivesse pena de mim e permitisse esse tal milagre, a profissão a que me dedicaria de corpo e alma seria a de Inspector num Centro de Inspecção Automóvel.

Não deverá haver nada mais emocionante do que dizer a um ricaço qualquer algo deste género: “Oh Sr. Dr. Visconde da Atalaia, o seu Ferrari chumbou na inspecção porque tem um CO2 acima do que está estabelecido. Faça favor de ir buscar a vinheta encarnada e terá de vir cá novamente num prazo de trinta dias”.

Quem não teve ainda a experiência de ir a um Centro de Inspecção Automóvel? Como não tenho pais ricos e nunca fui ao BES, posso dizer que sou um assíduo nestas coisas.

Levar o nosso carro a um centro de inspecção poderá ser das experiências mais humilhantes que nós poderemos ter no dia-a-dia. Anda um gajo a tentar não bater com o carro, a fazer revisões periodicamente e a gastar dinheiro para vir um indivíduo de bata azul dizer-me que o carro não passou na inspecção por isto ou por aquilo. Só dá vontade de pegar na moca que temos guardado no carro e dar-lhe na cabeça até ficar em sopa de tomate. Digam lá que não tenho razão?

Vou contar a minha experiência de há dois anos…

Já na véspera da ida ao Centro de Inspecção (último dia do prazo, obviamente) começava a nascer em mim uma certa ansiedade. «Como irá ser amanhã? Será que vai haver algum cabrãozeco que irá foder-me a vida?», eram perguntas que chocalhavam, então, no momento. Desculpem-me a linguagem utilizada, mas nos nossos pensamentos não conseguimos substituir os palavrões por beeeeeps de censura.

No dia da inspecção, tento levantar-me o mais cedo possível para poder ser um dos primeiros a ser atendido, contudo, por norma, não somos os únicos a pensar assim e quando cheguei ao local, a azáfama de carros já era muita. O ambiente é gélido, vai-se preparando os documentos sem, no entanto, deixar de se reparar nos carros uns dos outros, de forma a avaliar as hipóteses de sucesso ou insucesso de passar na inspecção. «Tu com esse farolim assim já estás arrumado, vai é pra casa ó badameco, só estás é a empatar aqui um gajo», pensei eu após ter deitado a vista ao carro que estava à minha frente.

Após a inscrição e um bom tempo de espera, lá ouvi o maquiavélico bata-azul a gritar pela matrícula do meu carro. Tinha chegado a hora. «Vá, mostra aquilo que vales, nada de fundires nenhuma lâmpada agora, nem borrares óleo pelo motor, e quando te meterem o tubo pelo escape acima, não tussas o catarro que tens dentro de ti. Se te portares bem, dou-te um super-aditivado de 98 octanas como prenda»

O carro avança lentamente para o local… mostro-lhe o triângulo, os coletes, brinco com os pisca-pisca a pedido do gajo, ora para a direita ora para a esquerda, dou-lhe com mínimos, médios e máximos e, de seguida, faço umas acelerações para que possa medir o monóxido de carbono. Observa os cintos e, já na parte em que examinava o veículo por baixo, chama por mim para ir ter com ele. «Sim… que se passa?». «Tem aqui um tubo que está a apontar para o chão e que deixa cair resíduos provenientes do carro», enquanto apontava para uma coisa minúscula que se situava precisamente no meio do carro. Tão minúscula que fiquei sem saber se realmente a tinha visto ou não. Após essa observação, mandou-me subir para o carro. E pronto, tinha acabado a inspecção.

«Então Sr. Inspector, o meu carro passou?», perguntei eu de imediato. «Faça o favor de ir lá dentro e esperar até que chamem por si», resmunga o bata-azul enquanto rabisca, pela última vez, os papéis que tem consigo. «Mas, mas… aquele tubinho minúsculo vai chumbar-me na inspecção?!?», voltei a interrogá-lo… sem resposta.

Enquanto me dirigia ao sítio indicado, passei por um velhote de ar tristonho, ar de derrotado, com a vinheta escondida entre as mãos, ainda trémulas, tentando não mostrar aos outros a vergonha de ter uma vinheta vermelha nas suas mãos.

Para se dar a vinheta vermelha é uma coisa rapidíssima e passados uns 2 minutos lá vinha o bata-azul, inchado, a indicar os motivos por ter chumbado o meu carro. O motivo tinha sido o tal tubo. O engraçado da história é que era a 5ª vez que ia à inspecção com o mesmo veículo, sempre no mesmo Centro, e nunca tinham detectado, até à data, tal anomalia… ou seja, o gajo andava à procura de festa. Por entre muitos rosnar de dentes, lá me calei e acabei por me ir embora.

No mesmo dia enfiei uma rolha de cortiça no tal tubo e passados 15 dias o meu bogas passou imaculadamente na inspecção… com o mesmo bata-azul!



Contudo, se queremos evitar este tipo de humilhações, poderemos optar por outras estratégias: ou pagamos a um mecânico para lá ir; ou entramos no jogo corrupto de pagar por fora a um desses bastardos; ou simplesmente não vamos à inspecção, sujeitos a sermos apanhados por algum geninho. No ano passado optei pelo caminho da corrupção. Num dos próximos posts irei contar-vos tudinho… não percam!

quinta-feira, novembro 02, 2006

Humanos - Quero É Viver

Estava a meio caminho da labuta, ainda meio ensonado, resignado pelas horas mal dormidas, pelo desenfrear do trânsito da 2ª circular e pelo tempo amorfo, ainda indeciso se iria chover ou fazer sol, quando comecei a escutar na rádio uma música dos Humanos, “Quero é Viver” e, de um momento para o outro, aquela letra de António Variações encheu-me de alegria para enfrentar mais este novo dia, que se adivinhava duro…

E pouco me importando com os olhares incrédulos que se cruzavam, acompanhei o refrão, em plenos pulmões, cantando “Quero é viver”.

Porque é que complicamos tanto a nossa vida? É tão simples querer viver…